África, donde os cravos vêm.
Muitas vezes, na história de Portugal, as mudanças de rumo passaram por África. E, algumas vezes, de África veio o sopro que nos empurrou para a democracia e para a liberdade.
Quando o país começa a interessar-se seriamente pelo continente africano, depois da independência do Brasil (1822) e da Conferência de Berlim (1884/85) – que retalha África ao gosto das potências europeias – o episódio do Mapa Cor de Rosa, tentativa de unir as costas de Angola e de Moçambique sob a bandeira portuguesa, esbarra com as ambições inglesas que pretendiam estabelecer uma continuidade imperial do « Cairo ao Cabo ». O Ultimato Britânico foi rapidamente obedecido pela frágil monarquia portuguesa. A humilhação nacional foi aproveitada pelo ainda incipiente movimento republicano. O Ultimato de 1890 foi o outro regicídio do qual a monarquia portuguesa nunca se recuperaria.
Em 1961, o contexto africano era bem diferente. Mas, uma vez mais, a impossibilidade de uma solução militar foi determinante. O estalar da guerra em Angola foi o início do fim do regime salazarista e do colonialismo português. O conflito começa discretamente com alguns ataques de guerrilha, mas rapidamente se alastra e redobra ferocidade com a passagem dos anos. Até se tornar insustentável. No seio do exército cresce o descontentamento e a certeza de que o conflito não tem uma saída militar. Foram treze anos de uma criminosa obstinação, de uma teimosia senil, um inútil sacrifício sem outra estratégia que não fosse a de resistir até à última gota de sangue.
No dia 25 de Abril de 1974 o Movimento das Forças Armadas, deita por terra a mais longa ditadura da moderna história europeia. Quantos anos passariam até que este golpe fosse possível se não fosse a guerra colonial, a guerra africana? Certamente, a chegada da democracia ter-se-ia atrasado mais uns quantos anos. Mas, é bem sabido, a História não se escreve com « ses ».
No mesmíssimo dia 25 de abril de 74, Miguel Torga escrevia no seu diário: “…dizem que os militares levaram a cabo um golpe de Estado. Desconfio disto. Afinal, quem nos tem amordaçado?”
Uma vez mais, a revolução, a liberdade, chegara de África e este agradecimento português ficou por dizer.